No contato do amor não é necessário biologia para explicar vínculo. É justamente esse contato, que transcorre pela jornada da adoção. Um abraço silencioso entre corações que se encontram em destinos distintos. Nesse caminho, a espera é uma dança de esperança e paciência, onde pais anseiam por uma conexão profunda, e filhos aguardam por um lar repleto de amor. Cada etapa é uma nota na sinfonia da transformação. Desde a decisão corajosa de adotar até os encontros emocionantes com crianças cujas histórias se entrelaçam com o desejo de pertencimento. Os trâmites legais unem assim, passados e futuros. Do sofrimento ao abandono, vidas negligenciadas em busca da família que indefere de raça, credo ou até sexualidade, crianças e adolescentes só desejam encontrar uma proteção.
Dados do Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento revelam que, no Rio Grande do Sul, cerca de 453 crianças aguardam receber a oportunidade de viver em um novo lar. Outras 665 estão em processo adotivo. Desde 2019, 2.397 crianças e adolescentes foram adotadas no Estado.
Mas infelizmente, no Brasil, a fila de espera de famílias interessadas na adoção ainda é considerada muito maior do que o número de quem vive, dia a dia, a esperança de sair, definitivamente, dos abrigos ou casas de acolhimento. Isso acontece porque o perfil que as famílias querem nem sempre é compatível com o perfil das crianças à espera de adoção.
Atualmente, em Caxias, esse perfil tem se alterado assim como, na procura pela adoção, principalmente, de crianças acima de sete anos. Na comparação com 2021, o número de adoções de adolescentes entre 12 e 18 anos quase dobrou. No ano passado, 59 ganharam uma nova família. No contraste, um aumento de quase 127% nas adoções foi identificado entre janeiro de 2021 e dezembro de 2023. Totalizando assim, nos últimos três anos, 116 crianças e adolescentes adotados no município.
O juiz da Vara Regional da Infância e Juventude, Diego Carvalho Locatelli, diz que apesar do desejo da adoção ser crescente e o processo ter se tornado menos burocrático, ainda apresenta atraso por questões de escolha do perfil. Um condicionante que no tempo do processo. No caso da adoção de bebês, a fila de espera pode chegar a até 10 anos.
Mitos como a ideia de que adotar uma criança é menos gratificante do que ter filhos biológicos, precisam ser desconstruídos para promover uma compreensão mais ampla e positiva sobre a adoção. Essa quebra de paradigmas faz parte da história dos administradores Simone e Fabrício Vettorazzi, ambos de 44 anos. A adoção surgiu para o casal após intercorrências no processo de terem filhos. Sem a certeza de que momento a adoção iria ocorrer, eles tinham apenas a definição que seria uma menina de até 3 anos de idade. Com cerca de um ano de expectativa, o processo de adoção foi oficializado e Maria Vitória chegou para a família. Simone, revela o quanto a menina foi aguardada durante todo o período.
Simone também revela o sentimento de pertencimento gerado na filha. Ela evidencia as etapas superadas e as evoluções presenciadas no elo construído.
Neste contexto, o Instituto Filhos é considerado um dos pilares do processo adotivo no município. Surgido em 2007, ele teve inicio com um grupo de pais que se reuniam para a troca de conhecimento em torno da adoção. A partir de 2009, com o surgimento do Estatuto da Criança e do Adolescente, o curso preparatório para famílias que estão na fila de adoção pelo Fórum da Comarca de Caxias do Sul (TJ/RS), se tornou obrigatório.
Atualmente, os honorários dos funcionários do Instituto Filhos são pagos pela Fundação de Assistência Social (FAS). A entidade é responsável por promover também atendimentos individuais, rodas de conversas com famílias que adotaram além do Adoção em Debate, onde ciclos de palestras que ocorrem uma vez por mês e viabilizam assuntos que envolvem a educação dos filhos. O presidente, José Otávio Carlomagno, destaca que se trata de um serviços totalmente gratuito para quem vive essa realidade.
Para José, o contato com a adoção ocorreu muito antes dele estar a frente deste trabalho. Foi em 2001, que ele e a esposa adotaram o primeiro dos cinco filhos adotivos, na época, com idades entre sete e 12 anos. Eles estavam em uma casa-lar, que ficava fundo a fundo com a residência do casal. A ideia da adoção foi da esposa. Um ato que, do acaso, transformou a rotina e a vida da família.
Para José, a experiência da adoção parece complexa, mas na verdade é a construção de um elo. Ele evidencia o orgulho da escolha, assim como, o fato de ser intitulado pai por todos os filhos adotados. Amor que vai além, do caráter biológico.
É justamente esse amor, que também traçou o caminho do fotógrafo Ednilson Vieira Godin, de 32 anos, e do funcionário público, Marcelo Maciel Godinho, de 55 anos. Eles moram em Passo de Torres, em Santa Catarina, na divisa com o Rio Grande do Sul. A decisão de expandir a família veio por meio da adoção. Um capítulo que se desdobrou com a chegada do primeiro filho, graças ao aplicativo Adoção: uma plataforma disponível em todo o território nacional, que simplifica a fila de espera.
Contrariando as convenções e desafiando as estatísticas, o casal optou por não estabelecer critérios relacionados ao sexo e cor da criança adotada. O único requisito foi a faixa etária, concentrando a atenção em adolescentes. Durante aproximadamente um ano, o curso preparatório desempenhou um papel importante no processo de espera. Uma fase que o casal considera essencial. Eles compartilham a importância dessa etapa, destacando como isso contribuiu para moldar as perspectivas e fortalecer os alicerces para a parentalidade.
Edmilson e Marcelo compartilham o desenrolar do processo de escolha dos dois filhos. Eles destacam os momentos significativos que culminaram na formação da nova família.
Ao encerrar esta jornada pelos corações acolhedores que optaram pela adoção, fica claro que este é um caminho de amor e resiliência. Cada família que se aventura nesse processo desafia não apenas as normas sociais, mas também descobre, no íntimo do ato, uma força transformadora que transcende todas as expectativas.
Neste cenário, as famílias que abraçam a adoção não apenas expandem os lares, mas principalmente, os corações. Podemos então definir adoção como um elo forjado na escolha, aceitação e compromisso de construir um futuro juntos. É uma narrativa que transcende genes, pois a verdadeira herança é o amor incondicional que transborda vidas e histórias.