O esquema de trabalho análogo à escravidão na produção vinícola em Bento Gonçalves, na Serra Gaúcha, veio à tona em fevereiro de 2023. Na ocasião, 210 trabalhadores contratados e transportados pela empresa Fênix Serviços Administrativos e Apoio e Gestão de Saúde Ltda. para a colheita de uvas em vinícolas da região foram encontrados em condições precárias. Nesta terça-feira (29), o Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Sul (MPT-RS) divulgou que a 2ª Vara do Trabalho de Bento Gonçalves condenou a Fênix e os proprietários ao pagamento de R$ 3 milhões por danos morais individuais, a serem destinados diretamente aos trabalhadores resgatados.
Segundo o Ministério do Trabalho, esse valor se soma aos R$ 2 milhões já pagos pelas vinícolas, que haviam terceirizado os serviços com a Fênix, como parte de um acordo firmado em março de 2023. Além disso, a atuação do MPT resultou em mais R$ 5 milhões por danos morais coletivos, quantia que foi revertida em projetos sociais na Bahia e na Serra Gaúcha.
Conforme o procurador da Procuradoria do Trabalho (PTM) de Caxias do Sul, Antônio Bernardo Santos Pereira, o caso que ganhou repercussão nacional contém diversas simbologias para a região, justamente por estar ligado à principal atividade produtiva local e pelo elevado número de trabalhadores envolvidos. De acordo com ele, a ação civil pública foi ajuizada ainda em 2023, após a recusa da Fênix em realizar o pagamento voluntário da indenização. Como medida cautelar, o MPT solicitou e obteve o bloqueio de bens dos responsáveis para garantir a reparação.
A sentença é passível de recurso. Caso não haja contestação ou a condenação seja mantida, se inicia a fase de execução. Se os valores não forem pagos voluntariamente, os bens bloqueados serão leiloados para garantir o cumprimento da decisão judicial.
O caso
A denúncia do caso foi feita por seis trabalhadores que conseguiram fugir do alojamento e procuraram a Polícia Rodoviária Federal (PRF). As vítimas, com idades entre 18 e 57 anos, a maioria oriundas da Bahia, relataram promessas de emprego com moradia, alimentação e transporte pagos pelas contratantes. No entanto, ao chegarem ao Rio Grande do Sul, foram informadas de que deveriam arcar com esses custos, o que os colocava em situação de dívida desde o início do trabalho.
As condições do alojamento eram precárias, com registros de superlotação, falta de higiene e relatos de ameaças, intimidações e até agressões físicas. Dos 210 trabalhadores resgatados, 207 foram encontrados no local, enquanto outros três haviam retornado de forma antecipada à Bahia com o apoio de familiares. Para aprofundar as investigações, foi criado o Grupo Especial de Atuação Finalística (GEAF), que reúne procuradores da Bahia e do Rio Grande do Sul.