O cenário climático do Rio Grande do Sul, especialmente na Serra Gaúcha, entrou em um novo patamar. Eventos extremos como enchentes e estiagens passaram a ocorrer com frequência e intensidade cada vez maior. A avaliação é do professor Juliano Rodrigues Gimenez, diretor do Instituto de Saneamento Ambiental da Universidade de Caxias do Sul (ISAM-UCS), doutor em Recursos Hídricos e integrante do Comitê Científico de Adaptação e Resiliência Climática do Estado.
Em entrevista à Rádio Caxias, Gimenez foi enfático: as mudanças climáticas deixaram de ser previsões e já fazem parte da rotina. “Estamos em uma nova condição climatológica. A normalidade mudou. Não é mais uma possibilidade futura — é o presente”, afirmou.
Volume de chuva atinge níveis históricos
Levantamentos feitos pelo ISAM-UCS mostram o avanço expressivo nos índices pluviométricos. A média anual de chuvas em Caxias do Sul era de aproximadamente 1.400 a 1.500 milímetros até 2020. No entanto, em 2023 o acumulado chegou a 2.392 mm, com episódios severos de inundação. Já em 2024, ano marcado por tragédias em todo o estado, o total subiu para 2.760 mm, sendo impressionantes 920 mm somente no mês de maio.
“É um volume absurdo, especialmente quando consideramos que esse total foi registrado em poucos dias. A chuva não só aumentou em quantidade, mas também em intensidade e frequência, o que é ainda mais preocupante”, explicou o especialista.
Caxias do Sul como modelo, mas desafios continuam
Gimenez destacou que Caxias do Sul já vem adotando medidas estruturais importantes, como a implantação de bacias de detenção, obrigatoriedade de retenção de água da chuva em novas construções industriais e outras ações voltadas à contenção e uso inteligente da água pluvial. “A cidade é exemplo em algumas práticas, mas a situação exige muito mais, principalmente políticas públicas amplas que envolvam todas as cidades da região serrana e de cabeceiras de bacias hidrográficas”, afirmou.
O professor também chamou atenção para a popularização do conceito de “cidade esponja” — urbanizações planejadas para reter mais água da chuva e liberá-la gradualmente. Segundo ele, a ideia é positiva, mas deve ser aplicada com critério. “Funciona bem em regiões de serra, como Caxias. Já em áreas ribeirinhas, como Eldorado do Sul ou Porto Alegre, pode não ser a melhor solução e até gerar investimentos sem retorno.”
Ações do Comitê Científico e políticas de Estado
Integrante do recém-criado Comitê Científico de Adaptação e Resiliência Climática do RS, Gimenez explicou que o grupo atua no apoio técnico à análise de projetos estratégicos, como obras de contenção de cheias, compra de radares e revisão de ações emergenciais. A atuação, segundo ele, deve agora ganhar caráter mais propositivo.
“Nós temos contribuído com relatórios técnicos e pareceres sobre projetos do Estado, como obras de dragagem e contenção. O comitê agora se encaminha para uma fase mais ativa na proposição de políticas públicas que estimulem adaptação e resiliência”, explicou.
Adaptação é urgente
Para Gimenez, os próximos passos exigem articulação entre Estado, municípios e a sociedade. “Não há soluções mágicas. Mas já sabemos o que precisa ser feito. Adaptação e resiliência não são mais escolhas — são condições para a sobrevivência urbana”, concluiu.
Entenda os números
Média anual histórica de chuva em Caxias do Sul: 1.400 mm
Acumulado em 2023: 2.392 mm
Acumulado em 2024: 2.760 mm (Somente em maio de 2024: 920 mm)
Confira aqui a entrevista completa.