No silêncio de uma sala de emergência, uma bolsa de sangue balança levemente, presa a um suporte metálico. Do outro lado da agulha, está a vida de alguém sendo resgatada. Pode ser um acidente grave, uma cirurgia delicada, uma criança com leucemia. Em todos esses cenários, existe um elo invisível entre desconhecidos: a doação de sangue, onde cada gota conta.
Para quem doa, o gesto pode levar apenas alguns minutos. Para quem aguarda, cada minuto é uma chance a mais de sobreviver. Apesar de milhares de pessoas lutarem todos os dias pela vida, contando com a solidariedade alheia, os bancos de sangue ainda enfrentam estoques abaixo do ideal. E vivem entre a urgência e a esperança de que mais pessoas estejam dispostas a estender a mão,e, literalmente, o braço, para salvar vidas.
Quando falamos em transfusão, poucos conhecem o termo hemoterapia. Na prática, a transfusão de sangue é apenas uma parte de um processo muito maior e mais complexo.A hemoterapia é a área da medicina que estuda e realiza o uso terapêutico do sangue e dos componentes composto por plaquetas, hemácias e plasma. Esse processo inclui a coleta de sangue dos doadores, os testes de segurança, a separação dos componentes, o armazenamento adequado e, por fim, a aplicação no paciente certo, no momento certo.
Ou seja, a transfusão é o resultado de uma cadeia cuidadosa de ações, que começa muito antes da agulha entrar na veia do paciente. E tudo isso só é possível graças ao trabalho dedicado de profissionais que garantem a segurança e a eficácia de cada etapa, essenciais no ato de salvar vidas.
No Hemocentro Regional de Caxias do Sul, esse processo é uma rotina diária. Desde a chegada do doador até a liberação das bolsas contendo os hemocomponentes para as 16 agências responsáveis por atender 49 municípios da região, o cuidado é contínuo e vital. E se o processo técnico é complexo, o gesto de doar é simples e nasce do altruísmo, como destaca o diretor técnico do Hemocs, Roque Lorandi.
Cada etapa do processo é fundamental, como explica Roque. O momento da doação, realizado pelo voluntário, é conhecido como “ciclo do sangue”.
Após a coleta, o doador recebe todos os cuidados necessários. Já a bolsa de sangue segue dois caminhos: primeiro, passa pela análise laboratorial, garantindo que está em perfeitas condições. Em seguida, se inicia a separação dos hemocomponentes.Entre eles, as plaquetas são um dos grandes desafios, como explica Roque Lorandi. O prazo de validade é de apenas cinco dias, e uma única doação de plaquetas pode equivaler a cerca de 10 kg do peso corporal. Uma pessoa de 70 kg, por exemplo, pode precisar de sete doadores para atender uma única demanda.
O Hemocentro também realiza transfusões no local, especialmente quando solicitadas por médicos das Unidades Básicas de Saúde. No entanto, a maior parte ainda ocorre em hospitais da região.O jovem Igor Tiboia, de 23 anos, conhece de perto a importância da doação. Diagnosticado com talassemia, uma doença genética que afeta a produção de hemoglobina e provoca anemia crônica, Igor depende de transfusões regulares para manter a qualidade de vida. Para ele, e para tantos outros, doar sangue não é apenas um ato de solidariedade, é a única opção.
Para os profissionais que acompanham o ciclo completo, desde quem doa até quem recebe, o trabalho vai além da técnica. É um exercício diário de empatia e humanidade. O técnico de enfermagem Iura de Oliveira, há 13 anos no Hemocentro, descreve esse sentimento.
Em 2023, o Hemocentro de Caxias do Sul registrou 11.844 doações de sangue total, que permitiram a separação e distribuição de 18.822 bolsas de hemocomponentes. No ano passado, os números aumentaram para 13.201 doações e 20.694 bolsas distribuídas. Em 2025, até o dia 31 de maio, já foram 9.302 bolsas entregues.
Esses dados representam vidas, cada doação pode beneficiar até três pessoas diferentes. São pacientes oncológicos, vítimas de acidentes, recém-nascidos e tantas outras realidades que, em comum, compartilham a necessidade de uma transfusão.Neste 14 de junho, Dia Mundial do Doador de Sangue, a data nos convida a refletir sobre um gesto simples que carrega um dos maiores significados possíveis: o de salvar vidas. Roque Lorandi reforça a importância da conscientização.
Ao longo desta semana, diversas atividades foram realizadas em alusão à data. A programação teve início na quarta-feira (11), com uma coleta externa, prática regular do Hemocs, no Hospital São Roque, em Carlos Barbosa. Também foi realizada uma ação de captação externa com o objetivo de informar, sensibilizar e recrutar novos doadores. O Hemocs recebeu ainda a Banda Vanguarda, da Guarda Municipal de Caxias do Sul, para uma apresentação artística aberta ao público, incluindo doadores e visitantes. As atividades foram encerradas com uma programação especial promovida pelo grupo “Voluntários da Alegria”, por meio do projeto “Heróis da Serra”, que recepcionou os doadores com a presença de super-heróis.
Além dessas ações, durante o mês de junho, o Monumento Jesus Terceiro Milênio, localizado no Parque de Eventos da Festa da Uva, será iluminado na cor vermelha, em homenagem aos doadores e como forma de reforçar a importância da causa.
Em um mundo em que tudo parece acontecer tão rápido, há gestos que duram poucos minutos, mas permanecem para sempre na vida de alguém.Doar sangue é doar esperança, é entregar anonimamente o que o outro mais precisa: uma chance. E se você não pode doar hoje, leve a mensagem adiante. Porque quando uma vida depende de uma bolsa de sangue, a diferença entre o fim e um novo começo pode estar em você. Compartilhe essa ideia, doe vida.
O Hemocentro Regional de Caxias do Sul funciona de segunda a sexta-feira, das 8h15 às 16h45, e aos sábados, das 8h às 12h, na Rua Ernesto Alves, 2260, ao lado da UPA Central. As doações podem ser feitas diretamente no local ou agendadas pelo WhatsApp (54) 98418-8487 ou pelo telefone (54) 3290-4580.