O Brasil vive um crescimento expressivo na judicialização das relações de trabalho. É o que revela o Relatório Geral da Justiça do Trabalho 2024, divulgado recentemente. De acordo com o levantamento, foram julgados mais de 4 milhões processos trabalhistas em todo o país no ano passado, o que representa um aumento de 14,3% em relação a 2023. A tendência de alta, com exceção do período entre 2018 e 2020, vem se mantendo nos últimos 20 anos.
Esse cenário também tem reflexos no Rio Grande do Sul, conforme explicou à Rádio Caxias o advogado trabalhista Flávio Luis Santa Catharina, que comentou os impactos locais do crescimento da litigiosidade.
“O número de processos trabalhistas no RS também acompanhou essa elevação. Desde a reforma trabalhista de 2017, houve inicialmente uma queda no número de ações, mas nos últimos anos o volume voltou a crescer de forma consistente”, afirmou o advogado.
Setores e temas mais judicializados
O advogada ainda explicou que, segundo o relatório, os setores mais demandados na Justiça do Trabalho, em 2024, foram:
- Serviços diversos (27,9%),
- Indústria (20,6%),
- Comércio (13,1%).
As principais causas das ações incluiam:
- Adicional de insalubridade,
- Verbas rescisórias,
- FGTS,
- Multa do artigo 477 da CLT,
- Indenizações por dano moral.
Na região da Serra Gaúcha, especialmente em cidades como Caxias do Sul, onde a indústria tem forte presença, Flávio explica que os temas mais recorrentes continuam sendo horas extras, verbas rescisórias e insalubridade — demandas que refletem o cotidiano das relações trabalhistas na região.
Justiça mais célere, mas ainda pressionada
O tempo médio entre o início da ação e o julgamento caiu para 197 dias, uma melhora de 8,4% em relação a 2020, demonstrando esforços da Justiça para manter a agilidade frente ao aumento de processos. Apesar disso, Flávio Santa Catharina alertou para a sobrecarga:
“Mesmo com o ganho de produtividade, o número crescente de novos processos — mais de 4 milhões recebidos em 2024, dos quais 3,6 milhões foram ações novas — tem provocado um acúmulo de casos pendentes, o que impacta na capacidade de resposta do sistema.”
De acordo com o advogado trabalhista, ouvido pela reportagem da Rádio Caxias, o RS vem adotando ferramentas tecnológicas, como o uso de inteligência artificial para triagem e organização de informações processuais, a fim de auxiliar os magistrados e reduzir o tempo de tramitação.
Conciliação e vitórias trabalhistas
Do total de decisões em 2024:
- 37,9% terminaram em acordos, o que mostra a relevância da conciliação como forma de resolução.
- 5,7% dos processos foram julgados totalmente procedentes,
- 28,9% parcialmente procedentes,
- Apenas 12,2% foram julgados improcedentes.
“A Justiça do Trabalho tem historicamente um alto índice de acordos. É uma marca da sua atuação e um reflexo da busca por soluções rápidas e justas”, avaliou o advogado.
Justa causa: reversões são comuns
A entrevista também abordou um tema sensível: as demissões por justa causa. Segundo Santa Catharina, muitos trabalhadores buscam a reversão desse tipo de desligamento:
“A justa causa pode sim ser questionada. Há uma alta demanda nesse sentido, e a Justiça analisa caso a caso. Além disso, desde a reforma de 2017, é possível buscar acordos extrajudiciais com força legal, o que vem sendo cada vez mais utilizado.”
Reflexo social
O advogado concluiu ressaltando que o aumento de ações trabalhistas é um reflexo direto das tensões nas relações de trabalho e da conscientização crescente dos trabalhadores sobre seus direitos.
“A Justiça do Trabalho espelha o que ocorre no mercado. Quanto mais instabilidade nas relações laborais, maior o número de litígios. E a tendência é que a judicialização continue crescendo, inclusive aqui no RS”, finalizou.
Confira aqui a entrevista completa.