O mercado de trabalho brasileiro vive uma transformação silenciosa, mas profunda. Apesar da taxa de desemprego ter recuado para 7% no primeiro trimestre de 2025 — o menor índice para esse período desde 2012 —, o crescimento da informalidade e da chamada pejotização (quando o trabalhador é contratado como pessoa jurídica) revela uma mudança estrutural na forma de contratação e na dinâmica profissional do país.
Segundo dados do Caged, mais de 654 mil vagas com carteira assinada foram criadas no início deste ano. No entanto, março registrou forte desaceleração nas contratações, um reflexo da sazonalidade típica do início do ano. Ao mesmo tempo, especialistas observam que os postos formais têm dado lugar, cada vez mais, a vínculos informais e precários, com salários baixos e pouca estabilidade — especialmente em setores como a construção civil e os serviços.
Para o professor Sidnei Alberto Fochesatto, coordenador do curso de Gestão de Recursos Humanos da Universidade de Caxias do Sul (UCS), essa tendência não é passageira. “Estamos vivendo um novo modelo de organização do trabalho. A informalidade e a pejotização refletem não apenas a tentativa das empresas de reduzir custos, mas também uma adaptação às mudanças tecnológicas e à nova lógica econômica global”, explica.
De acordo com Fochesatto, o avanço da automação e da inteligência artificial está acelerando a substituição de tarefas repetitivas e manuais, enquanto cresce a demanda por profissionais com competências digitais. “Atividades como telemarketing, digitação e serviços bancários tendem a desaparecer. Em contrapartida, áreas como cibersegurança, análise de dados, marketing digital e saúde devem se expandir rapidamente”, projeta. Ele também aponta que ferramentas de inteligência artificial já estão transformando processos internos das empresas, especialmente na área de Recursos Humanos. “Já vemos sistemas realizando triagens de currículos, entrevistas automatizadas e análises comportamentais. Isso muda completamente a forma como as empresas recrutam e contratam”, diz.
Fochesatto lembra que a pandemia de 2019 foi um divisor de águas, acelerando a digitalização dos negócios e consolidando o trabalho remoto. Com isso, surgiram novos desafios e oportunidades, como o crescimento de modelos alternativos de renda, a exemplo das plataformas digitais como Uber e Airbnb. “Esses serviços operam muitas vezes fora da legislação tradicional, o que evidencia um problema maior: os altos encargos sociais e a falta de um novo marco regulatório para o trabalho do século XXI”, analisa. Além dos impactos tecnológicos, o professor destaca fatores estruturais como a internacionalização das economias, o envelhecimento populacional e a descentralização das cadeias produtivas, que também estão moldando o futuro do emprego.
Fochesatto é direto: empresas que não investirem em inovação e na capacitação contínua de suas lideranças ficarão para trás. “A transformação digital não é mais uma opção — é uma necessidade. O futuro do trabalho será mais dinâmico, interconectado e digital”, afirma. Ele também faz críticas à forma como o RH ainda é visto em muitas empresas brasileiras, especialmente nas micro e pequenas: “Muitas ainda tratam a gestão de pessoas como uma área meramente operacional. Mas aquelas que conseguirem adotar uma abordagem mais estratégica — com foco em saúde mental, diversidade, equilíbrio entre vida pessoal e profissional — terão mais chances de atrair e reter talentos.”
Em um cenário em que a informalidade cresce e a tecnologia avança a passos largos, a conclusão do especialista é clara: o mercado de trabalho brasileiro está diante de uma encruzilhada. E o caminho escolhido agora será determinante para definir que profissões vão desaparecer — e quais vão prosperar — nas próximas décadas.