O número de brasileiras que se tornaram mães, após os 40 anos, cresceu 60% entre 2010 e 2022, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A tendência revela uma mudança nos projetos de vida das mulheres, que têm priorizado, cada vez mais, os estudos e a carreira profissional antes da maternidade. Em estados como Mato Grosso, Goiás, Espírito Santo e Rondônia, esse aumento foi ainda mais expressivo, ultrapassando os 100%. Para especialistas, esse fenômeno reflete uma transformação social importante: a maternidade deixou de ser um objetivo precoce para muitas mulheres e passou a ocupar um lugar mais estratégico e planejado na trajetória pessoal e profissional. Mas junto com essa nova dinâmica, surgem também desafios significativos para essas mães.
A psicóloga Sabrina Rugeri chama atenção para as consequências emocionais da maternidade tardia, muitas vezes invisíveis ou pouco discutidas. “Existe um sentimento de solidão e exaustão que acompanha muitas dessas mulheres, alimentado por uma culpa silenciosa e constante”, afirma. Segundo ela, a idealização da “mãe perfeita” impõe uma pressão irreal sobre as mulheres, que enfrentam jornadas triplas entre trabalho, casa e filhos, frequentemente sem uma rede de apoio concreta.
“Esse sentimento de culpa surge de forma muito sutil. Ele está ligado à crença de que precisamos dar conta de tudo, o tempo todo, sem falhar. Quando sentimos cansaço ou queremos um momento para nós mesmas, muitas vezes nos sentimos egoístas”, explica Rugeri. A psicóloga destaca ainda que a culpa é reforçada por um modelo de maternidade idealizado, perpetuado por redes sociais e discursos culturais, que não leva em conta os limites e as necessidades emocionais da mulher.
A sobrecarga, segundo Rugeri, não é apenas prática, mas também emocional. Muitas mães chegam aos consultórios psicológicos apresentando sintomas de estresse, ansiedade, depressão e até burnout materno – um esgotamento físico e mental que compromete a capacidade de cuidar dos filhos e de si mesma. “A qualidade do sono, a alimentação, o lazer e até as relações pessoais são afetadas. A mulher sente que perdeu sua identidade e passa a viver exclusivamente para a maternidade”, afirma.
Como forma de enfrentamento, a psicóloga defende estratégias que envolvem tanto o apoio emocional quanto medidas práticas. “É fundamental desconstruir o mito da mãe perfeita e validar uma maternidade possível, com falhas, acertos e afetos reais. Construir uma rede de apoio, dividir tarefas, redefinir prioridades e reservar pequenos momentos de autocuidado são atitudes que ajudam a aliviar a carga”, orienta.
Além disso, ela reforça a importância da terapia como espaço seguro para ressignificar crenças disfuncionais e acolher emoções. “Permitir-se ser humana é o primeiro passo para encontrar equilíbrio. Nenhuma mãe precisa – nem deve – dar conta de tudo sozinha. Maternidade não precisa ser perfeita para ser amorosa e significativa. Ela precisa ser possível, verdadeira e humana”, conclui.
Essa nova fase da maternidade, mais tardia e consciente, abre espaço para um debate urgente: como a sociedade pode apoiar melhor essas mulheres? O crescimento nas estatísticas mostra que a transformação já está em curso. Cabe agora acompanhar esse movimento com empatia, políticas públicas e estruturas que acolham as múltiplas faces da mulher-mãe do século XXI.