Como a psicanálise pode ajudar a responder dúvidas quanto ao futuro, neste contexto pós-tragédia, vivido pelo Rio Grande do Sul? Ou seria melhor questionar, como a saúde psíquica poderia garantir que os atingidos pelas enchentes estejam imunes de sofrer resquícios mentais dessa catástrofe climática? Será que podemos estar prestes a sofrer com outras crises, dessa vez de ansiedade ou síndrome do pânico? Ou ainda, com a depressão? São muitas as perguntas, mas o certo é que a tragédia dos gaúchos foi despersonalizada, ou seja, acometeu com uma série de pessoas o que, de certa maneira, conforme o psicanalista, Francisco Daudt, traz um certo alento para essas famílias; assim como, todo o suporte solidário vivenciado, desde o começo da tragédia climática no Estado.
O psicanalista ainda explica que o processo de luto, normalmente, tem diferentes estágios, sendo comum, no início, experimentar sentimentos de angústia e de aflição com a perda do ente querido. Contudo, no caso do Rio Grande do Sul, essa perda não se restringe, apenas, a morte inesperada de familiares e amigos, mas de coisas que representam essas memórias afetivas, a exemplo de álbuns de fotografia, ou então, que trazem para o individuo a sensação de pertencimento e de segurança, função simbolicamente representada pelo lar. Afinal, muitos deles, foram completamente destruídos pela força das águas. Portanto, na opinião do psicanalista, essa tragédia climática também trará consigo uma nova herança afetiva para o Rio Grande do Sul, graças a todo esse processo de assistência humanitária e que chega de diferentes partes do país e, mesmo, fora dele.
Na qual a sensação de vazio das vítimas dará lugar ao acolhimento, fruto dessas ações solidárias, onde prevalece o amor ao próximo, pois as pessoas tendem a minimizar os próprios interesses cotidianos em detrimento do outro, num exercício constante de empatia e que faz florescer a esperança por dias melhores.
O psicanalista ainda garante que toda essa situação de crise deve gerar uma herança solidária importante para o Rio Grande do Sul, na qual o povo gaúcho poderá contar com todo o amparo necessário, para superar esses momentos de crise e de retribuir, seja por meio de um sorriso ou de um simples obrigado. Contudo, o doutor Francisco Daudt salienta a necessidade da participação do poder público neste contexto. Afinal, a sua atuação, ou falta dela, será lembrada, possivelmente, nas urnas, momento cabal para o exercício da livre cidadania no nosso país. Ele lembra que essa premissa também valeria para àqueles que pretendem se promover ao custo das mazelas humanas, pois o momento é de altruísmo e de reciprocidade, não o contrário.
O doutor Francisco Daudt, é um profissional de renome nacional, que já assinou uma coluna, na Folha de São Paulo, até 2017.