Criado como uma revolução para a indústria e para a vida cotidiana, o plástico se consolidou ao longo do século XX como um dos materiais mais versáteis e indispensáveis do planeta. Leve, barato e resistente, passou a ser usado em embalagens, utensílios domésticos, peças automotivas e incontáveis outras aplicações. Porém, a mesma durabilidade que o tornou um sucesso comercial transformou-se em um dos maiores desafios ambientais do nosso tempo. A maioria dos plásticos não é biodegradável e pode levar séculos para se decompor, acumulando-se em aterros, rios e oceanos.
De acordo com estudos recentes, apenas uma pequena fração do plástico produzido no mundo é reciclada — cerca de 10% em média, com índices ainda menores em países como os Estados Unidos. No Brasil, mesmo cidades que são referência na separação de resíduos, como Curitiba e Caxias do Sul, ainda enfrentam dificuldades com a conscientização da população e a eficiência da reciclagem, como coloca a professora Camila Baldasso, doutora em Engenharia Química e que se dedica a pesquisas sobre o tema há mais de uma década.
O resultado é que toneladas de polímeros acabam diariamente na natureza. Diante desse cenário, pesquisas por alternativas que possam reduzir o impacto ambiental são cada vez mais imprescindíveis. É nesse ponto que entram os biopolímeros, macromoléculas produzidas a partir de matérias-primas renováveis e que podem ser biodegradáveis. A ideia não é substituir totalmente os plásticos derivados do petróleo, mas oferecer alternativas mais sustentáveis para determinadas aplicações.
E não precisamos ir longe para termos exemplos bem sucedidos dessas pesquisas. Dois projetos vêm se destacando na Universidade de Caxias do Sul (UCS). Com a orientação de Camila, as pesquisadoras Júlia Daneluz e Jocelei Duarte, doutorandas em Engenharia de Processos e Tecnologias, têm desenvolvido estudos que buscam soluções inovadoras envolvendo biopolímeros.
A pesquisa de Júlia tem como foco central a utilização de ágar, um derivado de algas marinhas, combinado a materiais como nanocelulose e grafeno. O objetivo é criar um polímero capaz de atender à indústria alimentícia, sendo utilizado para o armazenamento de alimentos. Com o acréscimo do grafeno, o produto desenvolveu maior resistência mecânica, tornando-se mais competitivo industrialmente. Júlia ressalta que o início da pesquisa foi muito desafiador, necessitando de leitura aprofundada e muitos testes para encontrar as medidas ideais de cada componente.
A equipe já depositou a patente da inovação e segue em fase final de testes, avaliando biodegradabilidade e durabilidade em prateleira. Mas esta não é a primeira pesquisa de polímeros biodegradáveis desenvolvida na UCS. O projeto de Jocelei tem como base o soro de leite, um subproduto da indústria láctea que, em vez de ser descartado, pode se transformar em matéria-prima para biopolímeros. Após inúmeros testes feitos, os resultados têm sido promissores, com o material se degradando em apenas 7 dias.
A ideia é aplicar o biopolímero em embalagens de uso único, como sacolas de supermercado, envoltórios de absorventes ou fraldas, produtos que dificilmente são reaproveitados e acabam em aterros sanitários. Os dois projetos enfrentam desafios semelhantes: garantir que o material seja competitivo em termos de resistência e custo, além de viabilizar a produção em escala industrial. Ainda assim, os avanços já despertam interesse de empresas, especialmente no caso do biopolímero à base de soro de leite, cuja patente está liberada e já conta com potenciais parceiros.
O futuro dos biopolímeros depende de uma combinação de fatores como investimento em pesquisa, adaptação da indústria e, sobretudo, a mudança de mentalidade da sociedade. A tendência é de crescimento acelerado. Segundo Camila, só nos últimos cinco anos, o uso de biopolímeros aumentou 300% no Brasil.
Para as pesquisadoras, mais do que resultados laboratoriais, os projetos representam uma oportunidade de colocar Caxias do Sul no mapa da ciência que busca respostas aos grandes dilemas ambientais. Júlia também destaca a importância de divulgar este tipo de iniciativa para a sociedade e mostrar o impacto que ela pode ter no cotidiano das pessoas.
O sucesso dos biopolímeros depende tanto da evolução científica quanto da aceitação social. A tendência é que esses materiais sejam cada vez mais incorporados ao dia a dia, não para substituir completamente o plástico convencional — que ainda tem aplicações estratégicas e vantajosas —, mas para complementar e reduzir seus impactos ambientais.
Para Camila, com o aumento da produção e a entrada de mais empresas no setor, o custo dos biopolímeros tende a cair, tornando-os ainda mais competitivos e acessíveis.
Seja em embalagens alimentícias ou em alternativas mais ecológicas para o consumo diário, o que se desenha é um caminho possível para diminuir a dependência do petróleo e reduzir o impacto do plástico no planeta. E parafraseando a pesquisadora Júlia Daneluz, o biopolímero não precisa ser o melhor em tudo, basta apenas que seja a solução certa para o problema certo.